quinta-feira, 2 de março de 2017

A piedade perfeita e os bens materiais.

Assim, tendo chamado a nossa atenção para o perigo da ostentação quando nos aplicamos de atos como as esmolas, a oração e o jejum, nosso Mestre vai tratar agora de como devemos lidar com os bens materiais e evitar um mal igualmente grave que, uma vez brotando no coração, corrompe nosso andar com Deus, desviando-nos do reino dos céus e impedindo-nos de desfrutar de comunhão plena com Ele e de confiar na Sua bondosa providência.

Para tratar do nosso relacionamento com os bens materiais, o Senhor começa fazendo uma dupla exortação: “Não ajunteis tesouros na terra”, e: “Ajuntai tesouros nos céus”, nas quais o Seu propósito não é condenar as riquezas em si, desde que estas sejam fruto do nosso trabalho (cf. Ec 3.13); mas sim o amor às riquezas que leva o homem a fazer delas um fim em si mesmo, ansiando por obtê-las e confiando na abundância delas.

Jesus revela que tal atitude é tola e inútil, pois os bens materiais estão sujeitos a muitas vicissitudes (a traça, a ferrugem, os ladrões), pelas quais podemos perdê-los facilmente; e enreda o homem em uma busca sem fim e desesperadora que o levará à condenação (Ec 5.10-14; Pv 23.4, 5; 1 Tm 6.9-10; Lc 12.15-20; Tg 1.9-11). Por outro lado, devemos ansiar e lançar mão de todos os esforços para enriquecermos para com Deus (Mt 6.33; 11.12; Jo 6.27), inclusive usando de nossos bens materiais (Mt 16.21; Lc 12.33; 16.1-9; 1 Tm 6.17-19); pois somente as riquezas acumuladas no reino de Deus são incorruptíveis e permanecem seguramente em depósito para o nosso proveito nos céus (Mt 25.34; 1 Pe 1.3-5).

Mais importante ainda é o fato de que o coração está intimamente ligado ao tesouro que escolhermos ajuntar, pois nossos pensamentos, intenções e afeições sempre se voltarão para aquilo que consideramos digno de valor e estima, e que nos esforçarmos por obter e acumular para o nosso desfrute. 

O amor às riquezas, portanto, é uma paixão carnal e insidiosa, que precisa ser mortificada a todo o tempo enquanto estivermos na terra (cf. Cl 3.5). A ilustração proposta nos versos 22 e 23 revela uma realidade ainda mais profunda na escolha do nosso tesouro. Os olhos são a “luz” ou “candeia” (cf. Lc 12.35, 36) do corpo, porque dependemos da visão para realizarmos qualquer obra através do corpo – se nossa visão é boa, nossos atos serão bem orientados, e seguiremos o caminho correto; se for ruim, nossas ações serão equivocadas, e nos desviaremos rapidamente do caminho.

Do mesmo modo, só é possível almejar as coisas celestiais e orientar nossa vida para elas se houver em nós um entendimento iluminado pela verdade, renovado pela graça de Deus (Jo 3.3; Mt 11.25-27); do contrário, o entendimento mundano não consegue ver a excelência do reino dos céus, e só leva à cobiça e avareza (1 Co 2.14; Ef 4.17-19). Mas, se aqueles que confessam seguir a Cristo, supostamente tendo os olhos iluminados, se deixam enganar pelas riquezas deste mundo, quanto pior é o seu estado e inútil a sua confissão! (cf. 2 Pe 2.20).

O desenvolvimento dessa verdade chega ao seu ponto mais grave com a declaração seguinte, de que ajuntar tesouros na terra não é nada menos que servir às riquezas como um outro deus – em outras palavras, é dividir com a criatura a lealdade do nosso coração, que é devida exclusivamente a Deus (Mt 22.37; 1 Co 5.11; Tg 4.1-4), implicando em terríveis consequências para a eternidade (Lc 16.13-14, 19-31).

Na sequência deste ensinamento, o Senhor Jesus passa à consideração de outro mal de natureza semelhante ao da cobiça e avareza, e igualmente presente no coração do homem natural: a ansiedade ou preocupação pela provisão das nossas necessidades materiais futuras (“o que haveis de comer”, “o que haveis de beber”, “o que haveis de vestir”). O fato é que Jesus está cuidando agora de um problema que constitui a raiz do amor às riquezas, e que também é pecaminoso e precisamos estar alertas para os seus primeiros sinais de manifestação.

É o cuidado excessivo pelas coisas desta vida, no temor de que possam vir a faltar, e a subsistência ser prejudicada, que tem lançado o homem à busca desenfreada e ao acúmulo excessivo delas, criando assim a falsa segurança de que, na sua abundância, estará precavido contra todos os infortúnios no dia de amanhã.

O remédio para a ansiedade, como veremos nas razões apresentadas por Cristo, está em Deus, no conhecimento da Sua bondade, poder, sabedoria e providência. Assim, o primeiro argumento é que Ele nos deu a vida, nossa existência depende dEle (At 17.28). A vida é mais excelente que as coisas necessárias para a sua manutenção, logo, por que Ele não nos daria também essas coisas? Depois, devemos considerar como Deus trata Sua criação não humana, provendo não apenas a vida mas sustentando cada criatura de forma maravilhosa, diariamente, com abundância e o que, humanamente falando, poderia ser considerado grande luxo e pompa (Sl 104.27-30).

E daí perguntamos: Por que Ele não faria o mesmo por nós, que trabalhamos pelo nosso pão e que, pela graça da adoção, somos considerados por Ele como filhos, muito mais valiosos e dignos do Seu cuidado? E, por último, somos relembrados do quanto é limitado o nosso esforço em prover nossas próprias necessidades – por maiores que sejam nossos cuidados, e por mais que trabalhemos, nada disto mudará nossa constituição e condição natural.

Embora seja uma atitude muito comum para o homem natural, a ansiedade pelos bens materiais equivale a uma incredulidade e falta de confiança em Deus.

Não é característico do discípulo de Cristo, daquele que recebeu entendimento para buscar as coisas que são cima, deixar-se envolver pelas preocupações que ocupam os corações daqueles que não conhecem a Deus (os gentios, cf. Mt 13.22). Mediante os argumentos ora apresentados por nosso Mestre, podemos descansar na certeza de que Ele sabe do que precisamos (cf. Mt 6.8), e trabalhar com sossego e confiança na Sua boa providência (Sl 127.1, 2; 103.13; Hb 13.5).

Tendo lidado com os males da cobiça, da avareza e da ansiedade proveniente da falta de confiança na providência de Deus, o Senhor contrapõe agora, ao objeto da preocupação dos gentios, aquilo que deve ser o foco de todos os nossos anseios e esforços: o reino dos céus e a sua justiça. Daquele que segue a Cristo é exigido que não apenas confie em Deus para provisão de suas necessidades, mas que renuncie a todo pensamento de que tais necessidades sejam essenciais, relegando-as a segundo plano (são as “demais coisas”), diante da excelência do seu chamado para participar das realidades eternas do reino (Cl 3.1). No mesmo sentido em que priorizamos a vinda do reino de Deus em nossa oração (Mt 6.10), também devemos buscar o seu poder e graça, ou a sua justiça, como nosso verdadeiro alimento, e bebida, e vestimenta.

O Senhor Jesus finaliza esta exortação à confiança em Deus e ao cuidado com a ansiedade lembrando-nos que o dia de amanhã, que tanto preocupa o homem, está fora do nosso alcance, e tudo o possa sobrevir nesse amanhã só poderá ser conhecido e tratado quando o amanhã chegar (cf. Tg 4.13-16). Quando entendemos que fomos chamados para viver em função do reino dos céus, e que todas as coisas estão no controle de Deus, servindo e contribuindo para o nosso bem, podemos lidar com o mal de cada dia como um teste da nossa confiança e dependência de nosso Pai celestial (Rm 8.28, 36) e viver satisfeitos com a nossa porção cotidiana (Fp 4.12, 13; 1 Tm 6.6-8).

Não há virtude em ser rico, nem em ser pobre; mas sim em ser capaz de apreciar as coisas que realmente têm valor – as coisas celestiais e eternas – e viver em função delas.

Mas, para isto, o coração precisa ser iluminado pelo Evangelho da graça de Cristo. Muitos que outrora confessavam ser cristãos deixaram-se enlaçar pelos cuidados desta vida, esquecendo-se da bondade de nosso Pai celestial, e naufragando na fé por causa do amor às riquezas.

Que possamos dar mais atenção e valor aos bens eternos e entender que nossa vida tem um propósito superior, mais excelente, e que Deus tudo fará para que o alcancemos com sucesso, inclusive provendo as “demais coisas” necessárias.

* Texto cedido por: EBD – 1º. Trimestre de 2017 

ASSEMBLÉIA DE DEUS 
MINISTERIO GUARATINGUETÁ-SP
“AS BEM-AVENTURANÇAS DO REINO”

Nenhum comentário:

Postar um comentário