Entrando
na seção final do Sermão do Monte, nesta lição o Senhor Jesus passa a fazer
diversas considerações acerca da excelência e severidade do reino dos céus,
chamando nossa atenção para a imparcialidade de Deus, já revelada no elevado
padrão de justiça exigida de Seus súditos, e a ser manifestada no último dia,
quando cada uma de nossas obras, desde a sua motivação mais íntima, será
provada e pesada na balança do Juiz de toda a terra. Considerando, então, a
gravidade do nosso chamado para sermos cidadãos dos céus, e do quanto se
exigirá de cada um de nós, o Senhor nos ensina, em primeiro lugar, que não
devemos estar prontos para condenar as faltas de nossos companheiros de
caminhada, mas antes olhar para nossa própria fragilidade, e assim aprender a
ser misericordiosos com o próximo, ajudando-o a levar suas cargas.
A
passagem que ora estudamos se inicia com uma proibição de nosso Senhor que,
embora categórica, não deve ser entendida de forma absoluta. A palavra julgar é
usada em vários sentidos nas Escrituras (1 Co 11.13; Lc 7.43; At 16.15, etc.),
mas aqui se refere a condenar, dar sentença de reprovação contra alguém. Jesus
não está proibindo o uso da razão iluminada pela verdade para discernir o bem e
o mal (Hb 5.14) e condenar as más obras (Ef 5.11), e mesmo ter uma atitude de
reprovação para com aqueles que as praticam (Rm 16.17; 1 Co 5.11; 2 Ts 3.6),
pois à igreja foi dada tal autoridade, para exercício da disciplina (1 Co
5.4-5; Mt 18.15-18); assim como, no que diz respeito a questões seculares, o
próprio Deus estabeleceu magistrados para julgar e condenar os homens pelos
seus crimes (cf. Dt 16.18- 20; Rm 13.3, 4).
Cristo
está tratando aqui do juízo temerário, isto é, da tendência natural do ser
humano de intrometer-se na esfera da individualidade do próximo com Deus,
presumindo entender suas motivações e pensamentos, sem maiores investigações ou
confirmação de simples suspeitas, e acabando por condená-lo injustamente pela
aparência (Lc 12.57; Jo 7.24; cf. Pv 18.13).
Para
nos dissuadir desse tipo de julgamento precipitado e injusto contra o nosso
próximo, o Senhor nos alerta que tal ato nos expõe, não ao juízo dos homens,
mas ao do próprio Deus, perante um servo que condena temerariamente a outro
servo não será justificado, mas condenado por presumir um poder que pertence
exclusivamente a Deus (cf. Mt 12.37; Rm 14.4, 10-12; Tg 4.11-12) – e essa presunção
é diabólica (cf. Jó 1.8-11; Ap 12.10).
Esta
palavra também revela a realidade do juízo final, do qual ninguém escapará, mas
todos teremos de prestar contas de nossos atos diante de Deus (2 Co 5.10; Cl
3.23-25), inclusive dos nossos mais ocultos pensamentos e motivações (1 Co
4.5).
Jesus
apresenta ainda uma razão para que estejamos em alerta contra o juízo
temerário, que é a regra áurea do nosso relacionamento com o próximo, como
tivemos oportunidade de estudar em lições anteriores: seremos tratados pelo
mesmo critério de que nos servimos para tratar os outros. Se nosso julgamento é
rigoroso, severo em condenar a partir do entendimento que temos sobre a
verdade, não devemos esperar ser julgados por Deus em um nível inferior (cf. Mc
4.24, 25; Lc 12.47, 48).
Certamente
esta é uma exortação à misericórdia, quando consideramos as faltas alheias,
pois é pela misericórdia que nós mesmos seremos livrados da severidade do juízo
de Deus (Lc 6.37-38; Tg 2.13; cf. Mt 5.7).
Longe
de proibir toda forma de discriminação quanto ao que é certo e errado, e de
censura ou disciplina sobre aqueles que laboram em erro, vimos que nesta
passagem o Senhor Jesus está condenando tão somente o juízo temerário, que
procede de uma presunção de superioridade em relação ao próximo, e que se
baseia em um rigor que exclui toda misericórdia. Cristo aponta agora outro
aspecto do espírito maligno que leva a esse tipo de julgamento: a hipocrisia. É
uma tendência natural do homem decaído investigar a vida do próximo em busca de
faltas, quando ele mesmo anda em erro, particularmente em erros piores do que
aqueles que julga no outro, e dos quais ele mesmo tem consciência (Rm 2.1-3).
Essa
era a atitude dos fariseus (Mt 12.1-2, 7-8; 23.34), que buscavam em coisas
indiferentes razões para condenar os outros. Através de uma comparação, Jesus
mostra a parcialidade e desproporção com que age o hipócrita ao julgar o seu
próximo, pois um cisco tanto é difícil de ser percebido – precisa ser
cuidadosamente procurado – como pouco atrapalha a sua visão; ao passo que a
trave é facilmente percebida e bloqueia quase que totalmente a visão. 22 Pela
recomendação feita por nosso Senhor, fica evidente que não é errado corrigir a
um irmão faltoso, em pecado, desde que primeiro tratemos dos nossos próprios
pecados. Não quer dizer que sempre estaremos em maior falta que o próximo, ou
que, quando percebemos a falha em outrem, certamente é porque incorremos em
falha maior.
Interessar-se
pelo bem do próximo é um dever já prescrito na Lei (Lv 19.17). Mas pelo
exercício da sinceridade para com Deus, em permitirmos que Ele nos sonde com a
Sua verdade e em confessarmos os nossos pecados a Ele (Sl 51.3, 12-13), e da
humildade para com o próximo, considerando-nos sujeitos às mesmas fraquezas (1
Co 10.12), aprendemos a tratar o irmão que tenha pecado com amor, misericórdia
e temor (Gl 6.1; Jd 22, 23; Tg 5.19, 20); e não com o espírito de hipocrisia
que em si é pior do que o pecado que pretendemos condenar, pois caracteriza uma
obstinação em relação ao nosso próprio pecado (cf. Rm 2.1, 3, 5-6).
A
comparação feita por Cristo no presente verso está em nítida relação com o
ensinamento anterior, e através dela nosso Senhor contrapõe, à proibição de
julgar temerariamente, a necessidade de um discernimento quanto às coisas
pertinentes ao reino dos céus, separando o precioso do vil (Jr 15.19; cf. Lv
10.10), e cuidando para que não sejam tratadas com desprezo por aqueles que não
reconhecem o seu valor e excelência. Jesus ensinou, antes, que os hipócritas se
preocupam com as faltas de seu próximo, ignorando ou rejeitando tratar dos seus
próprios pecados. Aqui vemos que há pessoas, em tais condições, que recusarão
qualquer forma de cuidado demonstrado para com a sua própria condição,
desprezando a verdade e até mesmo usando de violência para com aqueles que
demonstrarem interesse pelo seu próprio bem (Pv 9.8).
Em
primeiro lugar, aprendemos qual é a natureza do reino dos céus e de tudo aquilo
que nos foi dado pela graça de Deus: são coisas santas e preciosas (pérolas).
Depois, entendemos que essa riqueza não pertence apenas a nós, mas somos
incumbidos de compartilhá-las com outros – pois, se Ele proíbe de dá-las a
alguns, é porque é possível e necessário dá-las a outros, em tempo oportuno
(cf. Mt 13.52; 28.20). Por último, somos ensinados acerca da natureza de certos
homens que, mediante a oferta de um bem tão grandioso e glorioso, se sentirão
ofendidos em sua miséria e desprezo, e incitados à atitude insana de rejeitar a
verdade e se levantar contra os que a pregam. Tanto o cão como o porco são
animais impuros segundo a Lei e, no contexto do mundo antigo, caracterizados
por hábitos impuros (cf. 2 Pe 2.22); particularmente o cão era considerado um
animal indigno, desprezível (cf. 1 Sm 17.43; 2 Rs 8.13).
Por
um lado, é verdade que todos nós éramos inimigos de Deus (Cl 1.21), não sendo
melhores do que outros na recepção do Evangelho, pois fomos reconciliados pela
Sua graça estando ainda neste estado de rebeldia (Rm 5.8-10) – logo, não éramos
melhores do que os cães e porcos de que Jesus trata aqui. Por isso também o
Evangelho deve ser pregado a toda a criatura (Mc 16.15). Mas é justamente
porque alguns crêem e outros não que devemos discernir a operação da graça de
Deus no coração daqueles que ouvem, bem como perceber os sinais que
caracterizam uma rejeição obstinada à palavra pregada (Mt 10.11-15). Observamos
que o próprio Jesus falava em parábolas com a multidão, mas aos Seus
discípulos, que dEle se aproximavam em busca de entendimento, tudo falava
claramente (Mt 13.10- 13; Mc 4.34); aos que fechavam seu coração e rejeitavam o
testemunho de Suas obras e palavras, Ele recusava multiplicar os sinais, quando
não os abandonava (Mt 12.38-39; 13.58; 15.14); e as maiores demonstrações de
Seu poder e glória foram feitas em presença dos Seus discípulos amados (Mt
17.1-2; Jo 14.19 – cf. 1 Co 15.5-8), não da multidão.
O
reino dos céus nos introduz em uma realidade espiritual, onde somos agraciados
com muitos privilégios, mas também incumbidos de grandes responsabilidades que
apontam para um dia de juízo em que seremos individualmente julgados por Deus e
receberemos de acordo com o teor das nossas obras e do nosso coração. Por isso
devemos considerar uns aos outros como cooperadores na caminhada em direção ao
mesmo alvo, compadecendo-nos e prontos para ajudarmos nas fraquezas alheias,
bem como sermos ajudados em nossas próprias fraquezas (cf. Tg 5.16).
* Texto cedido por: EBD – 1º. Trimestre de 2017
ASSEMBLÉIA DE DEUS
MINISTERIO GUARATINGUETÁ-SP
ASSEMBLÉIA DE DEUS
MINISTERIO GUARATINGUETÁ-SP
“AS BEM-AVENTURANÇAS DO REINO”
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