Chegamos
ao ponto da epístola em que o apóstolo conclui sua consideração a respeito do
problema das dissensões na igreja de Corinto. Seu argumento final se baseia nas
verdadeiras características do ministério cristão, sua instrumentalidade e
responsabilidade para com Deus, seu serviço à igreja de Cristo e o mérito e a
glória exclusiva de Deus, que opera de forma eficaz através dos Seus obreiros.
Esta exposição acaba tornando-se uma defesa do próprio ministério de Paulo, na
qual ele lembra aos coríntios a sua devoção a Cristo e seu empenho pela
pregação do Evangelho.
A
princípio, quando receberam a palavra da cruz, os coríntios foram tratados por
Paulo como crianças, pois só eram capazes de assimilar os elementos mais
simples da sabedoria divina. Agora, pelo tempo em que esta epístola foi
escrita, tendo sido enriquecidos por Deus “em toda a palavra e em todo o
conhecimento” (1.5), era de se esperar que pudessem ser tratados como homens
espirituais. O quanto estava no apóstolo, ele não apenas fora capacitado por
Deus a instrui-los nas coisas espirituais (2.16), como desejava muito faze-lo.
Contudo, ainda não podia. Como falar de coisas mais elevadas àqueles que ainda
não eram capazes de compreender as práticas mais fundamentais da vida cristã?
Os
coríntios ainda eram carnais, andavam “segundo os homens” (v. 3) – homens
naturais aos quais não havia sido revelada a sabedoria divina. Ao invés de se
gloriarem em Jesus Cristo, “e este crucificado”, eles se importavam mais com as
aparências e diferenças dos seus pregadores. Esse sentimento faccioso e
contencioso é aquela sabedoria dos “príncipes deste mundo, que se aniquilam”
(2.6), que Paulo afirmou não ter nada de divina. Notemos que esses irmãos
haviam recebido sim o Espírito de Deus (2.12), e o apóstolo nunca põe em dúvida
a fé deles. Mas a sua conduta, na ocasião, não condizia com o seu chamado,
constituindo-se uma negligência ou falta de correspondência aos dons da graça
de Deus que haviam recebido. Se não fossem corrigidos, ficariam
impossibilitados de fazer maiores progressos na carreira cristã (cf. Hb
5.12-14).
Para
desfazer toda a pretensão que se pudesse alegar em nome dos pregadores do
Evangelho, Paulo lembra os coríntios de que ele, assim como os demais, eram
todos servidores (este é o sentido da palavra “ministro”), e que não havia
motivo para se gloriar neles, e sim em Deus, que os constituiu como tais e os
capacitou para serem instrumentos da fé dos coríntios (v. 5). Comparando a obra
do Senhor a uma lavoura, ele reconhece que a cada um cabe uma tarefa no cuidado
da igreja: “eu plantei, Apolo regou” (v. 6); mas ao mesmo tempo confessa que
todo o esforço dos trabalhadores seria inútil, não fosse o crescimento da
lavoura, que vem de Deus (v. 7). Ademais, todos cooperam em uma mesma obra,
visando um mesmo fim e a serviço de um mesmo Senhor, por isso ele diz: “todos
são um” (v. 8), e por isso também todos esperavam receber sua recompensa e
reconhecimento não da parte dos homens, mas sim de Deus, de quem são
“cooperadores”.
O
apóstolo se apresenta como “sábio arquiteto” (v. 10), aprovado na obra
exclusiva que lhe coube em relação aos coríntios – lançar o fundamento desta
igreja. Isto ele fez anunciando-lhes a Jesus Cristo, na simplicidade e poder do
evangelho. Esta obra ninguém jamais poderia repetir – nem Apolo, nem outros
pregadores que havia entre eles: “ninguém pode por outro fundamento além do que
já está posto” (v. 11). Tudo o que poderiam fazer agora era desenvolver seu
trabalho a partir do que Paulo já havia estabelecido naquela igreja: “veja cada
um como edifica sobre ele” (v. 10). Mas, mesmo assim, era possível que, sobre
este glorioso e firme fundamento, eles desenvolvessem tanto uma doutrina e
prática coerentes com a sabedoria divina revelada em Cristo, à semelhança de um
edifício de “ouro, prata e pedras preciosas”; como também poderiam inventar
doutrinas e práticas humanas, levantando um edifício de “madeira, feno e palha”
– indigno da glória do fundamento. Quando Cristo vier, e trouxer todas as
coisas à luz, o fogo do juízo de Deus revelará o valor dessas construções (v.
13): se for digna, o que a edificou “receberá galardão” (v. 14); se indigna,
sua obra se revelará inútil e vã (v. 15). Como exemplo disto vemos, ao longo da
história da Igreja, líderes que, por um lado, foram muito sábios e piedosos,
mas em certos aspectos se afastaram da simplicidade e pureza da palavra,
pregando e ensinando coisas que não passavam de doutrinas e preceitos de
homens.
Tendo
falado da responsabilidade dos edificadores da igreja, o apóstolo completa a
comparação destacando que a igreja é o próprio edifício de Deus, o “templo de
Deus”, no qual habita o Espírito Santo (v. 16). Portanto, pretender sabedoria e
capacidade humana para realizar essa nobre e grave tarefa seria “enganar-se a
si mesmo” (v. 18), e correr o risco de, ao invés de edificar a igreja de Deus,
destrui-la – o que levaria um pregador ou obreiro presunçoso a sofrer uma
severa repreensão da parte de Deus (v. 17). Enfim, os ministros do Evangelho
são homens, e os coríntios não deveriam considerar serem deste ou daquele, mas,
pelo contrário, que todos estes pertencem a eles, pois são cooperadores de Deus
em benefício da igreja, servindo-a com os seus talentos, assim como tudo o mais
nesta vida atende ao bom propósito de Deus para o Seu povo: “seja o mundo, seja
a vida, seja a morte, seja o presente, seja o futuro” (v. 22).
Tendo
encerrado o seu argumento principal contra as dissensões que havia em Corinto,
o apóstolo Paulo continua ainda a tratar da consideração que se devia dar aos
ministros do Evangelho e, particularmente, ao seu ministério entre eles. De
forma geral, os obreiros são “despenseiros dos mistérios de Deus”, na
administração da palavra em toda a ciência e sabedoria divinas; e de um
despenseiro espera-se apenas que seja fiel em repartir com os seus conservos e
irmãos esse depósito que lhe foi confiado. Mas, em particular no caso de Paulo,
ele não se considerava dependente da aprovação de qualquer homem – nem dos
coríntios, nem dele mesmo – quanto ao seu ministério, pois, como ele mesmo
havia dito, é Deus quem recompensará os seus cooperadores, e o fogo provará a
obra de cada um: “pois quem me julga é o Senhor” (v. 4).
Essa
também era uma forma de calar as razões daqueles que se agrupavam sob o nome do
apóstolo, ou se colocavam contra ele, diminuindo o mérito da sua obra entre
eles. Se havia diferenças entre este e aquele obreiro, Paulo lembra que todos
haviam recebido seus dons particulares de Deus, não tendo de que se gloriar ou
ensoberbecer: “que tens tu que não tenhas recebido?” (v. 7). E então os
repreende pela sua soberba, comparando a condição de autossuficiência em que se
encontravam com a de sofrimentos, reveses e aflições por que passavam os
apóstolos por amor a Cristo: “Nós somos loucos por amor de Cristo, e vós sábios
em Cristo; nós fracos, e vós fortes; vós ilustres, e nós vis” (v. 10).
Para
finalizar, notemos ainda que esta repreensão tinha o propósito de levar os
coríntios a considerarem devidamente o papel representado por Paulo no
estabelecimento desta igreja, no seu trabalho único como pai da sua fé, e, por
isso, como um ministro que deveria ser tido em alta estima e como modelo a ser
imitado, como um pai e tutor: “Admoesto-vos, portanto, a que sejais meus imitadores”
(v. 16).
A
exemplo de Paulo, todo aquele que é chamado por Deus para o ministério da
palavra tem uma grande responsabilidade para com a Igreja, e deve cuidar para
que sua obra seja realizada com fidelidade. E a igreja, por sua vez, ao invés
de aderir a qualquer espécie de facção, opondo-se ou favorecendo a este ou
aquele obreiro, deve considera-los como seus servidores, cooperando todos, com
os seus dons e talentos particulares, para o benefício espiritual da “lavoura
de Deus”.
Texto cedido por: EBD – 3º. Trimestre de 2018
1ª CARTA AOS CORÍNTIOS
MINISTÉRIO GUARATINGUETÁ-SP
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