sexta-feira, 10 de maio de 2024

Proposta de reinterpretação da ideia do pecado original

Há um entendimento no meio cristão e entre os estudiosos da Bíblia que o pecado cometido por Adão foi passado para todos os homens não levando em consideração algumas passagens bíblicas como: “Eis que todas as almas são minhas; como o é a alma do pai, assim também a alma do filho é minha: a alma que pecar, essa morrerá” (Ezequiel 18:4). O pecado original é um assunto bastante comentado e há várias controvérsias como bem explana, entre outros objetivos, com a pretensão de explicar sobre o possível impedimento espiritual e moral, sob o qual os homens nascem. Na verdade bíblica há uma “desobediência original” de Adão ao comer da árvore da ciência do bem e do mal através da ilusão da mulher – Eva, pela serpente contrapondo as ordens divinas que primeiramente come o fruto e depois leva para o marido. O pecado traz a morte e o homem nasce agora afastado de Deus, necessitando de reconciliação. É certo que o homem foi criado com a vocação de ser filho de Deus isso sendo alcançado pela comunhão com o Criador e o consequente aprimoramento dos frutos do Espírito. Entretanto, Aparicio-Gómez (2000, p.4) entende que com a doutrina do pecado original, muitas vezes a invenção é atribuída a Agostinho (LAMELAS, 2012, p.55), a fé cristã tenta destacar duas coisas: “a validade de um fator supra pessoal, que distorce a relação homem-Deus; e a presença de uma graça abundante onde abundará o pecado”. É também chamado de “pecado inerente” (DE OLIVEIRA, 2004, p.4; ANTUNES, 2021, p.15) devido ser a raiz interna de todos os pecados atuais, porque se deriva de Adão e estar presente na vida de cada indivíduo desde o momento do seu nascimento. Ao tratar sobre do “vício hereditário” Ricoeur (2008) concorda com a significação dada pelos pais da Igreja dizendo que o pecado havia passado para a humanidade através de Adão e não somente “uma imitação como defendiam os Pelegianos”, destacando a “culpalidade original” inclusive das crianças mesmo no ventre da mãe sem ainda conhecer o certo ou o errado RICOEUR (2008, p.3). Os pais da Igreja grega diziam que há uma corrupção física na raça humana proveniente de Adão, uma privação da graça divina (VILAR, 1968) devido ao mal uso da liberdade, ou “drama da fragilidade humana” (MARTINS, 2015, p.201), porém isto não envolve culpa como propõe Cunha (2003) nem questão sexual (ELIADE, 1984; PILLA, 2013; GATT, 2019), o que corresponde a uma diferenciação feita no livro de Levítico ao separar o conceito de propiciação pelo sacrifício de expiacão de pecado e o de propiciação pelo sacrifício de expiacão de culpa (ou existência de culpa). Segundo Iwashita (2005) a Igreja Católica, uma antiga igreja cristã, assim ainda é ensinada nos catecismos e estudos (HERRERA-GABLER, 2014) que ele foi o primeiro pecado na terra. Com isso todos os descendentes de Adão e Eva, exceto a Maria, que foi mãe de Jesus, vieram ao mundo com ele e suas consequências. (Separar a “irmã” Maria é claramente um grande equívoco!) Pois ela no livro de Lucas apresentou dois pombinhos como expiação de pecado e não culpa. (Luc 2.24) O sacrifício era para a mãe ou para o filho? Certamente era para a mãe e um dos motivos era o fluxo de sangue (“Todo homem que tiver fluxo a sua carne está imundo”). No livro de Levítico no capítulo 12 isto é explicado melhor: “Se uma mulher conceber,..., será imunda sete dias”. Para a criança a lei não pede nada? Não. Então, por quê? Se tivesse pecado aos olhos de Deus, seria pedido o sacrifício de expiação de pecado ao nascer. Não tem pecado, mas também não tem vida, a vida espiritual. E, concluindo esta parte, fica claro biblicamente que Deus não imputou pecado, e ainda no caso de Jacó e Esaú, no ventre de sua mãe, a palavra diz que não tiveram pecado e sim por eleição foi dito que o maior serviria o menor (Rm 9.12) Ainda existem polêmicas sobre este assunto como destacam Meis Wörmer (1993) e Da Silva (2009). Inclusive, e, historicamente, foi motivo de cismas, com o Pelagianismo e a religião natural negando o pecado original e o Molinismo que pregava a não destruição da liberdade da vontade (TEIXEIRA, 2018), possíveis heresias e divisões entre os cristãos desde os séculos iniciais do cristianismo, além de “visões” divergentes de antropólogos, psicanalistas e outros sobre o seu real significado. Neste tópico estaremos discorrendo sobre a premissa bíblica, a bíblia pela bíblia, apenas. Apenas?! Mas, e a Bíblia, o que diz? E tentando responder o questionamento estaremos discorrendo sobre o assunto, com diversos olhares bíblicos e com homogeinidade exegética, como bem explicam os hermeneutas, que a Palavra deve sempre trazer luz à Palavra! Bem, como um dever de consciência e verdade pessoal, já tendo discorrido outras opiniões, gostaríamos de apresentar uma interpretação, supondo ser a mais próxima da veracidade bíblica. Para isso, discorreremos no livro sagrado: no livro do Gênesis, no capítulo 3, os primeiros seres humanos e antepassados da humanidade, Adão e Eva, foram advertidos por Deus de que, se comessem do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, no mesmo dia morreriam, o que fizeram tendo sido instigados pela serpente, tendo Eva aceitado a instigação primeiro e oferecido à fruta a Adão, que aceitou. No entanto continuaram vivos, apesar da expulsão do Jardim do Éden, então parece razoável entender que Deus estava falando de outro tipo de morte, a morte espiritual, que Guerra (2020, p.195) trata como “a consequência mais dura foi o rompimento da relação entre deus e a humanidade”. Isso é salientado fortemente também no Novo Testamento: o apóstolo Paulo descreve o estado dos cristãos na Epístola aos Efésios, no capítulo 2, antes da conversão como aqueles que estavam “mortos em ofensas e pecados”, já na primeira epístola ao seu filho na fé, Timóteo, no capítulo 5, ele declara: “Mas a que vive em deleites, vivendo está morta” e o próprio Cristo coloca isso claramente também no evangelho segundo Mateus, no capítulo 8, “Deixa os mortos sepultar os seus mortos”. Então, não foi alterada a constituição humana, pois, embora o homem não regenerado esteja fisicamente vivo, ele está morto aos olhos de Deus. Posteriormente, na epístola aos Romanos, no capítulo 5, há o seguinte texto no qual, não é devidamente interpretado, pois ao contrário do que está escrito, gerou muitas convicções equivocadas: “Portanto, como por um homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado a morte, assim também a morte passou a todos os homens por isso que todos pecaram.” O que passou a todos os homens? Foi o pecado? Não, segundo o texto bíblico foi a morte, morte espiritual. Assim, a humanidade não está contaminada nem manchada pelo pecado origina, pois a herança recebida foi morte e não pecado... Então, nascendo morto espiritualmente, isto é, separado de Deus, vivendo só na carne e sem o auxílio divino conforme está escrito: “... Andai em Espírito e não cumprireis a concupiscência da carne” (Gl 1.6), só nos resta abundarmos dos frutos da carne, e assim pecar e continuar pecando. , “... por isso que todos pecaram.” (Rm 5.12) Assim, concluindo este raciocínio e respondendo a Gatt (2020), nós não somos herdeiros do pecado original, e, sim da “morte original” e nascemos fisicamente afastados do Eterno. Em contraste com as obras da carne, temos o modo de viver íntegro e honesto que a Bíblia chama “o fruto do Espírito”. Esta maneira de viver se realiza no cristão à medida que ele permite que o Espírito dirija e influencie sua vida de tal maneira que ele subjugue as obras da carne, e ande em comunhão com Deus (Rm 8.5-14). Assim, para apenas “não se impor a questão do pecado original, apenas por razões empíricas” (O'CALLAGHAN, 2014, p.162) e/ou dogmáticas, como a causa do mal (DE GODOY, 2016), entre outras, não se observando com precisão as orientações bíblicas, proponho ao teológico cristão uma reconsideração do conceito de pecado original. Então, biblicamente, baseado não na tradição ou no dogma, mas apenas nas Escrituras, há pecados sem culpa e pecados com culpa. Quando se peca com consciência, entendimento, então há culpa e os defensores dessa ideia proclamam que o homem nasce já em pecado e, assim, necessita da graça redentora de Cristo, sim necessitam, mas é para ter vida espiritual, pois biblicamente nascem mortos espiritualmente. Proponho assim uma nova reinterpretação de pecado original assim, concluindo e entendendo ser mais adequado, que se mudasse o tema tão conhecido e polemizado de “pecado original” para morte original, pois considero mais preciso biblicamente, ou ainda, para tendência original ou inclinação para pecar.

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